Da série: Eles me Entrevistam.
Pergunta enviada por Cezar Fittipaldi
No panorama da literatura brasileira atual, contemporânea, há uma evidente aura de globalização. Alguns autores estão sendo traduzidos no exterior, existem várias correntes surgindo, temos até um "best seller" global, Paulo Coelho. Tem pretensões de viver exclusivamente da literatura? E em caso afirmativo, pode detalhar as estratégias para tal?
Quando me foi pedido para que eu escolhesse um curso superior para fazer, eram três as possibilidades: educação física (a mais óbvia porque o esporte era a coisa mais presente na minha vida até aquele momento), as artes plásticas (porque além do esporte eu gostava de criar com as mãos) e a matemática (por conta do raciocínio lógico, dos desafios de resolver problemas e equações mesmo sendo tão dislexa com a aritimética). Nunca consegui me imaginar numa sala vestindo terninhos e sapatos altos para encarar uma empresa. A matemática para mim não tinha esse caráter docente, enxergava mais como uma forma de pensamentos complexos de cálculos abstratos, que sempre foi o que me fascinou. Foi a primeira carreira que tirei do bolo. As artes plásticas sairam fora depois de a mesma frase martelar a minha cabeça muitas e muitas vezes:
- um artista não é um curso de graduação,
- um artista não é um curso de graduação,
- um artista não é um curso de graduação.
Ao contrário sempre achei necessário ter uma formação para trabalhar com o corpo. Talvez pelo fato de eu ter sido vítima de especialização precoce - muito treinamento físico em idade inadequada - , o que contribuiu para eu querer outras coisas além do esporte profissional como carreira. Mas por quê estou contando todo esse percurso? Sempre me pareceu desnecessário um escritor precisar de um conhecimento técnico que nãos fosse um bom domínio da língua e isso uma boa formação escolar era capaz de oferecer os recursos necessários. O aprofundamento de temas também sempre me pareceu claro depender do amadurecimento de cada um, das experiências de vida e da forma como cada pessoa compreende, escreve e lê o mundo. A curiosidade que vejo, agora refletindo, é que em nenhum momento sequer passou pela minha cabeça a opção do curso de letras já que eu ficava tardes e tardes escrevendo, escrevendo e escrevendo.
Digo de tudo isso porque, uma vez que sempre estive longe da mecânica do universo das letras, tanto em relação às críticas literárias, às suas correntes, ao processo mercadológico que aí estão envolvidos, fica muito evidente que eu não faço uma correta ideia do que, hoje, é considerado literatura contemporânea brasileira. Sequer de outro país. Sei de alguns autores que estão em evidência. Alguns eu li, outros não. Sei de autores que, fora desse circuito mercadológico, têm seus nomes respeitados mas eu, embora procure, não sei quem, de fato, são. Sei que Nelson de Oliveira vem produzindo coletâneas e mais coletâneas para divulgar os novos nomes de nossa literatura. Mas acredito que sejam os novos nomes que o próprio Nelson de Oliveira conhece por uma coincidência ou outra ou por pertencerem ao mesmo grupo de pares. Uma indicação aqui, outra ali, mais uma acolá. E me incomoda pensar que para cada rótulo que se cria, como forma de mídia, se deixa de lado um tanto de outras possibilidades e de escritores que nós sequer sabemos que existem. Fico até pensando, caso algum dia eu seja convidada a participar de tais compêndios, até que ponto esta mistura que se cria entre os rótulos e os autores correspondem às minhas expectativas literárias.
Não me incomoda, hoje, não saber traçar um panorama consistente deste mundo que chamam literário. Acompanho dele o que posso, frequento festas, lançamentos, bibliotecas e livrarias. Estou sempre rodeada de um livro, uma frase, um blábláblá. Sei que os envolvimentos, como os romances, precisam de tempo para se constituirem e se estabelecerem. Desta forma, acho que só serei capaz de responder a essa pergunta, com maior precisão, daqui alguns anos. Até lá, claro que tenho uma estratégia, planos mirabolantes para, daqui quatro ou cinco anos eu poder viver exclusivamente de minha literatura. E o "minha" aí posto nessa frase faz toda uma diferença. Pra mim, que sou de outra área de formação e CLT, viver de literatura é um conceito abrangente. Se eu viro a mesa, deixo minha primeira opção de carreira de lado para encarar a literatura, montar oficinas de criação literária, montar projetos de estímulo à leitura e muitas outras ações parecidas correspondem a esse viver de literatura. Mas creio que a pergunta que foi feita vá um pouco mais além. Diz da ideia de eu querer viver da renda de meus livros vendidos.
Claro que eu não vejo de uma forma ruim, e acho perfeitamente possível, poder fazer dos livros de contos, crônicas e romances o meu cofrinho principal, principalmente se ele, somados mais uns quatro ou cinco anos, se tornar um algo auto-sustentável. Mas acho pouco. Caso isso aconteça e, sim, eu tenho uma estratégia para isso (digo sempre que me aposentarei aos 40 anos, junto com o término dos Jogos Olímpicos a ser realizados aqui no Brasil), estarei correndo atrás de outros desafios. Talvez eu decida começar tudo de novo, mais uma vez, e escolher uma nova profissão. Talvez eu queira viver das artes plásticas ou volte para a graduação para estudar cálculo diferenciado. Metade de mim já tem vontade uma vontade política e talvez este também seja um novo caminho. O que eu sei, por enquanto, é que as estratégias pertencem a mim. Aos poucos vou as revelando, na medida em pesquiso e aprendo mais sobre o mundo literário. Quem acompanha o blog já sabe um pouco como eu penso.
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